Em meio às expectativas sobre o encontro diplomático com autoridades americanas, militares russos anunciaram a retomada da cidade de Sudja, na região de Kursk
Por O GLOBO | PARA NETO GAIA.
Yuri Ushakov, conselheiro de política externa do presidente russo, Vladimir Putin, afirmou nesta quinta-feira que Moscou não tem interesse em um cessar-fogo temporário com a Ucrânia.

Ministério da Defesa da Rússia/AFP
A declaração de Ushakov à imprensa estatal acontece no mesmo dia em que negociadores americanos viajam a Moscou para tentar garantir o aceite do Kremlin ao acordo de cessar-fogo previamente negociado com a Ucrânia, e que o Ministério da Defesa da Rússia anunciou ter retomado o controle pleno de Sudja, importante cidade na região fronteiriça de Kursk, que foi parcialmente ocupada por forças ucranianas em uma ofensiva lançada em agosto do ano passado. O avanço acontece um dia depois da visita de Putin, à região fronteiriça, em que ordenou a libertação total do território.
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O conselheiro de Putin afirmou que a Rússia busca um acordo de longo prazo, que leve em consideração seus interesses e preocupações, criticando o cessar-fogo de 30 dias proposto por americanos e ucranianos, que disse que apenas ofereceria uma “trégua temporária” às forças de Kiev. Ushakov ainda afirmou que nenhuma das partes envolvidas precisa de medidas que “apenas imitem ações de paz”, e que espera que a delegação dos EUA esteja disposta a ouvir as demandas russas.
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A retomada de Sudja e de outras duas localidades, confirmada nesta quinta, vem na esteira de uma ofensiva que muitos acreditam ser o avanço final para liberar a província russa da presença ucraniana. Apenas na quarta-feira, o Estado-maior russo disse ter capturado 430 soldados de Kiev, e informações do Ministério da Defesa do Reino Unido apontavam que a área controlada pelas forças ucranianas era de 300 km² — apenas uma fração dos 1.400 km² ocupados na fase inicial da ofensiva.
Mesmo autoridades ucranianas admitiram retrocessos. O comandante do Exército ucraniano, Oleksandr Syrski, que no começo da semana havia ordenado o envio de reforços a Kursk, declarou em uma publicação nas redes sociais que foram necessárias “manobras” para posições mais favoráveis.
“Nas situações mais difíceis, minha prioridade foi e continua sendo salvar as vidas dos soldados ucranianos. Com esse objetivo, as unidades das forças de defesa, se necessário, estão manobrando para posições mais favoráveis”, escreveu.
A perda de território em Kursk é particularmente preocupante para a Ucrânia em um momento em que mediadores americanos estão a caminho da Rússia para tentar obter uma resposta positiva ao plano de cessar-fogo total por 30 dias, apontado como fase inicial de um processo de paz, termos com os quais Kiev já concordou.
Quando a ofensiva contra o território russo foi lançada, a esperança era de que o controle territorial pudesse ser usado como moeda de troca na mesa de negociações, forçando os russos a devolverem regiões ucranianas incorporadas pelo país forçosamente — uma área estimada em 20% do território do país. No fim do ano passado, soldados ucranianos chegaram a declarar publicamente que suas ordens eram para manter as posições até a posse do presidente americano, Donald Trump, em uma visão otimista sobre a capacidade do republicano de mediar um fim do conflito.
O porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov — que disse ontem que Moscou iria esperar pela apresentação formal dos termos do acordo com a Ucrânia pelos EUA para se pronunciar, sugerindo que poderia ser necessário um contato direto entre Putin e Trump — confirmou nesta quinta-feira que os negociadores americanos estão a caminho de Moscou.
— Os negociadores estão voando e há contatos previstos — disse Peskov, sem detalhar os nomes dos integrantes da delegação americana, acrescentando que o assessor da presidência russa Yuri Ushakov conversou por telefone com o conselheiro de Segurança Nacional dos Estados Unidos, Mike Waltz.
Horas antes, a Casa Branca informou que Steve Witkoff, enviado especial do presidente Donald Trump e mediador para os conflitos de Gaza e da Ucrânia, visitaria Moscou esta semana.
Como parte de um eventual acordo, a Rússia exige o fim das sanções contra o país, impostas devido à ofensiva contra a Ucrânia iniciada em fevereiro de 2022, que o Kremlin classifica como ilegais. Em manifestações anteriores, Moscou já afirmou também que não aceitará devolver à Ucrânia as regiões ocupadas de Donetsk, Kherson, Luhansk, Zaporíjia, incorporadas ao território russo por meio de um controverso plebiscito realizado em meio à guerra e sob ocupação russa, e nem a península da Crimeia, tomada em 2014.
Outro ponto que é motivo de discórdia diz respeito a garantias de segurança exigidas pelo presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, que aparentemente não foram contempladas nesta fase inicial, em que se busca apenas uma trégua no front para negociações mais decisivas. Inicialmente, Zelensky esperava que os aliados ocidentais aceitassem Kiev como um Estado-membro da Otan, afirmando que a aliança transatlântica seria a única forma de garantir que Putin não voltaria a atacar o país — algo que os aliados não bancaram e que a Rússia rejeitou, afirmando que se ocorresse, consideraria uma agressão direta de todo o Ocidente.
Sem o apoio dos aliados e com a relação com os EUA abalada após o retorno de Trump ao poder, Zelensky passou a defender a ideia do envio de uma força europeia à Ucrânia para atuar em uma missão de manutenção da paz. A ideia, contudo, também é rejeitada por Moscou, que vê como um risco o envio de tropas para perto de suas fronteiras.
PUBLICADO ÀS 9: 5, DESTA QUINTA-FEIRA, 13.