Segundo a Defensoria Pública do Estado de SP, maioria dos parentes aderiu ao programa de reparação extrajudicial; companhia diz que segue ‘dedicada à resolução das questões indenizatórias’

José Maria Tomazela | Paranetogaia.com.br
Publicado em 08/08/2025 | Às 6h 10.
Vídeo mostra momento em que avião da Voepass cai em Vinhedo. Tragédia ocorreu em agosto de 2024 e deixou 62 mortos.
Um ano após a queda do avião da Voepass, em Vinhedo, no interior de São Paulo, o processo de indenização das famílias avança. Os seguros obrigatórios já foram pagos e parte das indenizações também. Os valores são altos e não foram divulgados por questões de segurança. Em nota, a empresa diz apoiar as famílias e que segue “dedicada à resolução das questões indenizatórias” (veja mais abaixo).
Segundo a Defensoria Pública do Estado de São Paulo, familiares de 53 das 62 vítimas do voo 2283 aderiram ao programa de reparação extrajudicial que envolve também a Defensoria Pública do Paraná e os ministérios públicos dos dois Estados – a maioria das vítimas é do estado vizinho. O número corresponde a 85,5% das famílias.
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Conforme a defensora pública Estela Walksberg Guerrini, coordenadora do Núcleo Especializado de Defesa do Consumidor da Defensoria Pública do Estado de São Paulo, as indenizações são pagas pela seguradora das companhias aéreas Voepass e Latam – o voo era compartilhado através do sistema conhecido como codeshare.
Os valores por vítima levam em conta o dano material e moral decorrente da morte. Por ser uma obrigação da seguradora, a suspensão das operações da Voepass não afeta o pagamento das indenizações.
De acordo com Estela, as adesões de 53 famílias ao programa de reparação extrajudicial aconteceram em tempo recorde. “Lançamos o programa no final de novembro e em três meses conseguimos obter as adesões. Nesse momento, a maior parte dos valores já foi paga. A adesão foi facultativa, havia a opção judicial, que é mais demorada, custosa e imprevisível”, disse.
Um núcleo de mediação da Fundação Getulio Vargas (FGV) atuou como facilitador das negociações. Entre as famílias das outras 9 vítimas, cinco movem ações através de advocacia especializada e não há informações sobre a situação das outras quatro famílias.
O que as investigações apontam?
Conforme relatório do Centro Nacional de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa), durante o voo, a aeronave enfrentou condições meteorológicas propícias à formação de gelo, mas o sistema de degelo foi ligado e desligado repetidas vezes, indicando possível falha.
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O sistema de detecção de gelo foi ativado a partir do nível de voo de 13 mil pés (3,9 km de altitude), 57 minutos após a decolagem. “Vários alertas relacionados a esse sistema foram emitidos durante o voo. O sistema anti-gelo (nível 2) foi acionado pela tripulação durante a subida e permaneceu ligado durante todo o voo. Por sua vez, o sistema de degelo (airframe de-icing) foi ligado e desligado repetidas vezes”, diz o Cenipa. Nível 2 é um nível mais sofisticado do sistema de degelo.
Cenipa faz animação para mostrar como foi o voo de aeronave da Voepass

Órgão da FAB apresentou relatório preliminar sobre acidente em Vinhedo (SP). Crédito: Divulgação: Cenipa
Foram registrados também alertas Cruise Speed Low (baixa velocidade de cruzeiro) e, posteriormente, Degraded Performance (performance degradada) – quando o avião encontra condições que reduzem sua capacidade de voo, como o acúmulo de gelo, que aumenta o arrasto e diminui a sustentação. Durante a curva que antecedeu a perda de controle, foi exibido o alerta “Increase Speed” (aumente a velocidade), seguido de ruídos de vibração na cabine.
Conforme o Cenipa, às 13h21, cumprindo sua navegação aérea, a aeronave fez uma curva à direita momentos antes da perda de controle, entrando em uma condição chamada ‘stall’, vindo a perder sua sustentação em voo.
Como resultado, os pilotos perderam o controle da aeronave, que entrou em atitude anormal de voo, descrevendo giros em torno do seu eixo (parafuso chato), culminando em sua colisão com o solo na área residencial de Vinhedo – nenhuma pessoa em solo foi atingida.
O programa Fantástico, da Globo, do último domingo revelou que um funcionário da Voepass teria ouvido de um piloto que viajou com o ATR-72-500 no dia anterior ao acidente que o sistema de degelo do avião estava com problema e deveria ir para manutenção. A falha, que poderia impedir o avião de decolar de Cascavel (PR) no voo do acidente, não foi anotada no diário de bordo técnico.

Questionada a respeito, a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) disse que o ATR-72, fabricado em 2010, se encontrava em condição regular para operar no momento do acidente, com seus certificados de matrícula e de aero navegabilidade válidos. O voo contava com quatro tripulantes a bordo, devidamente licenciados e com habilitações válidas.
A agência informou que acompanha a investigação conduzida pelo Cenipa para a apuração das causas do acidente. “Como o processo segue em andamento, não é possível afirmar, neste momento, o que causou o acidente aéreo, sob pena de se disseminar, infundadamente, pânico e desinformação. Como o Cenipa ainda não emitiu seu relatório final sobre os fatores que contribuíram para o acidente, é preciso aguardar a divulgação do documento e suas eventuais recomendações para que procedimentos sejam alterados, se necessário.”
A Voepass diz que em hipótese nenhuma seus aviões decolam sem estar em estrita conformidade com a regulamentação e que o envio de aeronaves para manutenção faz parte da rotina de todas as companhias aéreas.
“Somente as investigações oficiais poderão apontar as causas do acidente. Especulações sobre reparos técnicos realizados no passado servem apenas para aumentar o sofrimento e a imensa dor das famílias dos 58 passageiros e 4 tripulantes envolvidos neste trágico acidente”, diz.
